Como identificar arapucas em investimentos
(Aquiles Mosca – Coluna do Gestor, Jornal Valor Econômico 16/ago/2019)
Finalmente parece que alcançamos a tão almejada realidade de juros nominais e reais baixos. Há muito o mercado aguardava que as condições macroeconômicas permitissem, não na marretada, mas com fundamento, o recuo e a manutenção sustentada dos juros nos atuais patamares.
No entanto, nem tudo são flores. A realidade atual é inédita no Brasil. Exatamente por isso, poucos gestores, investidores e assessores de investimentos têm alguma experiência realmente relevante com o manejo de aplicações em um ambiente minimamente semelhante ao que vemos hoje no mercado local. Uma rápida passada de olhos no currículo profissional da maioria vai revelar essa deficiência. Tal cenário é propício ao surgimento de falsos conhecedores, fraudadores e outras espécies de aproveitadores.
Como então identificar e, o mais importante, evitar que o investidor caia nessas arapucas financeiras? Felizmente, a cadeira de finanças comportamentais tem registrado aspectos comuns que, quando observados em conjunto, ajudam a expor falsos especialistas e criminosos financeiros, esses últimos geralmente associados a esquemas de pirâmides, como as vistas recentemente no Brasil.
O cérebro humano tem uma tendência a deixar-se persuadir por um certo conjunto de características que, invariavelmente, estão presentes nesses esquemas, sejam eles por meio de uma bem elaborada fraude ou por um simples falso vendedor de soluções financeiras, com promessas de enriquecimento acelerado.
O primeiro fator a ser identificado nesse processo é o que se chama nas ciências comportamentais de “efeito halo”. Esse efeito refere-se à forma como o indivíduo se apresenta ao potencial cliente. Uma pessoa atraente e bem vestida é usada para levar a proposição ao investidor. Instintivamente, a maioria gosta de estar próxima, tende a dar ouvidos e a considerar como uma fonte confiável alguém com tais características. No entanto, por si só, isso não nos permite desmascarar o esquema. Precisamos de mais elementos.
A característica seguinte a que devemos prestar atenção é o chamado “viés do especialista”. Tendemos a seguir pessoas que acreditamos ser um expert. Menções repetidas aos anos de experiência, sucesso no passado e a um conhecimento quase que exclusivo do caminho a ser seguido são alardeados como forma de gerar o “viés do especialista”.
Raramente são apresentados dados concretos, auditados, regulados e públicos para fundamentar as colocações. Repare que verdadeiros especialistas não precisam recorrer a esse discurso. Alguém já viu o Warren Buffet ficar se gabando de décadas de experiência e dos ganhos que teve ao longo da carreira? Nunca. Os números reais e públicos de suas atividades falam por ele.
Por fim, os falsos especialistas buscam gerar uma percepção de escassez artificial. Um discurso permeado por expressões como “só essa semana”, “apenas hoje” e “vou abrir para vocês os segredos que estavam guardados” é utilizado para explorar a associação instintiva que nosso cérebro faz entre escassez e valor.
Toda fraude financeira identificada até hoje, desde o esquema de Bernard Madoff em 2008 às pirâmides que ruíram no Brasil no primeiro trimestre deste ano, apresenta as características descritas acima. De forma menos dramática, também estão presentes na crescente oferta de aconselhamento financeiro e de investimentos que vemos hoje no mercado local. Previna-se recorrendo ao que a cadeira de finanças comportamentais já identificou como forma de separar o joio do trigo.
Algumas perguntas objetivas são úteis e reveladoras. Como por exemplo, quantos anos de atividade e experiência concreta na gestão o indivíduo tem em cenário de juros baixos? Ou, os resultados alardeados são públicos, regulados e auditados? Tenho que pagar para vê-los e mesmo assim não atenderão essas condições? Por que a oferta é por período limitado? Por que só agora? Vale a pena exercitar esse questionário e evitar ser mais uma vítima.
E-mail: aquiles.mosca@br.
Artigo originalmente publicado no Jornal Econômico, na coluna do Gestor, no dia 16 de agosto de 2019.
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